Lula afirmou nesta terça-feira (18) que só existe ‘uma coisa desajustada neste país: é o comportamento do Banco Central’. Decisão sobre a taxa de juros será anunciada nesta quarta (19), após as 18h.
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) se reúne nesta quarta-feira (19) e deve interromper o ciclo de corte da taxa básica de juros, que vem desde agosto do ano passado, segundo a projeção de analistas do mercado financeiro.
Se confirmada a manutenção da taxa Selic, ela permanecerá em 10,50% ao ano, o menor nível desde fevereiro de 2022, ou seja, em pouco mais de dois anos. No atual patamar, a taxa brasileira é alta na comparação internacional.
A decisão do Copom, formado pela diretoria e pelo presidente da instituição, Roberto Campos Neto, será tomada em meio ao fogo cerrado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) — que subiu o tom das críticas ao tamanho da taxa de juros nos últimos dias.
“Só temos uma coisa desajustada neste país: é o comportamento do Banco Central. Essa é uma coisa desajustada. Presidente que tem lado político, que trabalha para prejudicar o país. Não tem explicação a taxa de juros estar como está”, declarou Lula nesta terça-feira (18).
Lula afirmou ainda que o Brasil não pode continuar com juros “proibitivos”, que inibam os investimentos produtivos, o crescimento do país e a geração de empregos.
O BC tem de autonomia em sua atuação, sendo que o atual presidente, Roberto Campos Neto, com mandato até o fim de 2024, foi indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
A instituição diz que seu papel, na fixação da taxa de juros, é técnico, e busca conter a inflação.
Campos Neto tem lembrado que o BC subiu os juros em 2022, ano eleitoral. Também avaliou que os juros são altos no Brasil porque a dívida é alta. “A gente não pode confundir causa e efeito”, disse, em 2023.
Em seus documentos, o BC informa que um patamar mais alto de inflação prejudica, principalmente, a população de baixa renda.
Na última semana, o Banco Central informou que o lucro líquido dos bancos subiu para R$ 144,2 bilhões em 2023, e bateu novo recorde histórico.
Como as decisões são tomadas
Para definir a taxa básica de juros e tentar conter a alta dos preços, no sistema de metas de inflação, o Banco Central olha para o futuro, e não para a inflação corrente, ou seja, dos últimos meses.
Isso ocorre porque as mudanças na taxa Selic demoram de seis a 18 meses para ter impacto pleno na economia. Neste momento, a instituição já está mirando na meta deste ano, e também para o segundo semestre de 2025 (em doze meses).
A meta de inflação deste ano, definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), é de 3% e será considerada cumprida se oscilar entre 1,5% e 4,5%;
A partir de 2025, o governo mudou o regime de metas de inflação, e a meta passou a ser contínua em 3%, podendo oscilar entre 1,5% e 4,5% sem que seja descumprida;
Na semana passada, os economistas do mercado financeiro estimaram que a inflação de 2024 somará 3,96% e, a de 2025, 3,80%. Ou seja, acima da meta central nos dois anos.
As previsões do mercado financeiro subiram relação ao patamar vigente, por exemplo, há três meses atrás. No começo de março, a projeção dos analistas estava em 3,74% para a inflação de 2024 e em 3,50% para o IPCA do próximo ano.
Em março, o Banco Central estimou que as projeções de inflação do Copom em seu cenário de referência estavam em em 3,5% em 2024 e 3,2% em 2025. Já no começo de maio, o BC estimou uma inflação de 3,8% para 2024 e de 3,3% para 2025.
Com isso, as projeções dos analistas, e também do BC, estão se distanciando as metas centrais de inflação, fixadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
“Na inflação, após dois meses de resultados relativamente benignos, o IPCA de maio trouxe uma surpresa desfavorável, com uma deterioração dos serviços, com o núcleo do segmento e dos serviços intensivos em mão-de-obra (além da média geral dos núcleos) acelerando e ficando acima do previsto. As expectativas de inflação continuaram um processo de desancoragem relevante [das metas], contaminando períodos para além do horizonte relevante atual do Copom [até 18 meses] e, portanto, sinalizando perda de credibilidade da autoridade monetária”, avaliou o BTG, em análise.
Eventos dos últimos meses
As expectativas de inflação deste ano e de 2025 começaram a subir com mais intensidade após alguns eventos que aconteceram na economia nos últimos meses. São eles:
Em meados de abril, o governo federal propôs reduzir as metas de superávit primário para as contas públicas dos próximos anos. Se confirmadas pelo Legislativo, as novas metas possibilitarão um aumento de despesas de cerca de R$ 160 bilhões em 2025 e 2026. Mais gastos, por sua vez, tendem a pressionar a inflação;
As enchentes no Rio Grande do Sul também estão pressionando a inflação, pois alguns itens de alimentação com origem no estado, como arroz por exemplo, tendem a ter aumento de preços. O próprio Ministério da Fazenda já elevou sua estimativa de inflação por conta disso, assim como os agentes do mercado estão fazendo;
Houve um “racha” na diretoria do BC na última reunião do Copom, quando aconteceu uma diminuição no ritmo de corte dos juros – fixando a Selic em 10,50% ao ano. O temor do mercado é que a diretoria do BC indicada pelo presidente Lula – com maioria no Copom a partir de 2026 –, possa ser mais leniente com a inflação, em busca de um ritmo maior de crescimento da economia;
O dólar subiu muito nas últimas semanas, atingindo, nesta segunda-feira (17), R$ 5,42 — com uma alta de 11,72% no ano. Dólar alto, por sua vez, tende a pressionar a inflação no Brasil, pois os produtos importados ficam mais caros, e isso normalmente é repassado aos consumidores.
Além da expectativa de pressões inflacionárias maiores no Brasil, também contribui para uma política de juros mais conservadora no país, segundo analistas, a demora do BC norte-americano (o Federal Reserve) de iniciar as reduções nos Estados Unidos – o que diminui o espaço para cortes no Brasil.
Efeitos na economia
De acordo com especialistas, uma taxa de juros maior no Brasil tende a ter algumas consequências na economia. Veja abaixo algumas delas:
Reflexo nos juros bancários: a tendência é que a contenção da queda da Selic influencie as taxas cobradas dos clientes bancários. Em abril, a taxa média de juros cobrada pelos bancos em operações com pessoas físicas e empresas teve pequena queda de 0,1 ponto percentual em abril, para 40,4% ao ano — ou seja, relativa estabilidade.
Crescimento da economia: com juros mais altos, a expectativa é de um comportamento mais contido do consumo da população e, também, de mais dificuldades aos investimentos produtivos, impactando negativamente o Produto Interno Bruto (PIB), o emprego e a renda. Nos últimos meses, os dados de atividade têm surpreendido positivamente.
Piora das contas públicas: juros mais altos também desfavorecem as contas públicas, pois aumentam as despesas com juros da dívida pública. Em 2023, a despesa com juros somou R$ 718 bilhões em 2023, ou 6,6% do PIB.
Impacto nas aplicações financeiras: investimentos em renda fixa, como no Tesouro Direto e em debêntures, porém, teriam um rendimento maior, com o passar do tempo, do que seria registrado com juros mais baixos. Isso pode contribuir para diminuir a atratividade do mercado acionário.